O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) determinou que galgos resgatados de maus-tratos em 2021 devem retornar aos seus antigos exploradores, o que gerou indignação entre protetores de animais e ativistas. O caso envolve dezenas de galgos que foram apreendidos durante uma operação da Polícia Militar Ambiental em Araranguá, onde viviam em condições degradantes e eram explorados em corridas clandestinas.

A decisão da 1ª Câmara de Direito Civil do TJSC, tomada por maioria de votos, negou o recurso do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, que pleiteava a perda definitiva da guarda dos animais pelos exploradores. Após quase três anos vivendo em segurança sob os cuidados de protetores e em lares temporários, os galgos maus-tratos agora enfrentam a perspectiva de retornar ao mesmo ambiente onde sofreram violência e exploração.
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O caso dos galgos de Araranguá: uma decisão polêmica
A batalha judicial começou em maio de 2021, quando os animais foram resgatados em uma operação que revelou um cenário chocante: galgos mantidos em condições precárias, sem cuidados veterinários adequados, e utilizados exclusivamente para corridas ilegais onde serviam como objeto de apostas.
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Durante a apreensão, as autoridades encontraram evidências claras de que os animais eram tratados como meros instrumentos de lucro. Os galgos apresentavam sinais evidentes de maus-tratos físicos e psicológicos, resultado de anos de exploração em uma atividade expressamente proibida pela legislação brasileira. O estado de saúde precário dos animais e as condições do local onde eram mantidos demonstravam total desrespeito ao bem-estar animal.
Apesar de reconhecer parcialmente a crueldade sofrida pelos galgos, o tribunal optou por uma interpretação que priorizou o suposto direito de propriedade dos exploradores. Esta decisão desconsidera completamente o risco concreto que os animais correm ao retornar ao mesmo ambiente de exploração, violando princípios fundamentais da dignidade animal estabelecidos pela legislação brasileira.
A posição majoritária do tribunal gerou forte reação do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, que já anunciou recursos contra a decisão. A instituição manifestou respeito formal pela decisão judicial, mas deixou claro que utilizará todas as vias legais possíveis para evitar que os galgos maus-tratos retornem à situação de vulnerabilidade.
Corridas de galgos no Brasil: prática cruel e ilegal
Os Galgos, conhecidos por sua velocidade e elegância, são submetidos a treinamentos exaustivos e condições de vida deploráveis quando utilizados para este fim. A prática transforma animais sensíveis e inteligentes em meros objetos de entretenimento e apostas.
O perigo das corridas clandestinas é que os animais enfrentam riscos constantes de lesões graves, desde fraturas até problemas cardíacos causados pelo esforço extremo. Muitos animais são descartados quando não apresentam mais performance satisfatória, sendo abandonados ou sacrificados de forma cruel. A indústria clandestina de corridas trata estes cães como mercadoria descartável, ignorando completamente suas necessidades básicas de bem-estar.
As corridas de galgos alimentam redes criminosas envolvidas com jogos ilegais e lavagem de dinheiro. A atividade movimenta quantias significativas através de apostas clandestinas, criando um ciclo vicioso onde o sofrimento animal serve como base para atividades ilícitas mais amplas.
Três anos de recuperação podem ser perdidos
O impacto emocional da decisão judicial nos galgos maus-tratos de Araranguá não pode ser subestimado. Durante os três anos sob cuidados de protetores, estes animais experimentaram pela primeira vez o que significa viver com dignidade, receber cuidados veterinários adequados e, principalmente, sentir-se seguros e amados. Este período de recuperação permitiu que muitos galgos superassem traumas e desenvolvessem vínculos afetivos saudáveis.
A adaptação destes cães à vida doméstica representa um processo complexo de reabilitação física e psicológica. Muitos chegaram aos cuidados temporários apresentando comportamentos típicos de animais traumatizados: medo excessivo, agressividade defensiva, problemas de socialização e dificuldades para confiar em humanos. O trabalho de recuperação envolve não apenas tratamento médico, mas também terapia comportamental para ajudar os animais a superar as sequelas dos maus-tratos.
Para os cuidadores temporários que se dedicaram à recuperação destes galgos maus-tratos, a decisão é uma frustração profunda. Muitos desenvolveram vínculos emocionais com os animais e testemunharam sua transformação de seres traumatizados para cães confiantes e carinhosos.
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O que diz a lei sobre galgos maus-tratos no Brasil
A legislação brasileira oferece proteção robusta contra galgos maus-tratos, mas a aplicação prática destas leis ainda enfrenta desafios significativos. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 225, parágrafo 1º, inciso VII, proíbe expressamente práticas que submetam animais à crueldade, estabelecendo base legal sólida para combater a exploração de galgos em corridas.
Esta proteção constitucional é complementada pela Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998), que tipifica como crime a prática de maus-tratos contra animais, prevendo penalidades que incluem detenção e multa. A lei considera crime qualquer ato que cause dor, sofrimento ou lesão desnecessária aos animais, enquadrando perfeitamente as condições impostas aos galgos em corridas clandestinas.
No âmbito estadual, Santa Catarina possui a Lei 17.986/2021, que proíbe especificamente as corridas de galgos em todo território catarinense. Esta legislação reconhece explicitamente a crueldade inerente à prática e estabelece penalidades para quem promover, organizar ou participar de corridas de galgos. A existência desta lei torna ainda mais questionável a decisão judicial que permite o retorno dos animais aos exploradores.
A aplicação efetiva destas leis depende da atuação coordenada entre órgãos ambientais, Ministério Público, Poder Judiciário e sociedade civil. O caso dos galgos maus-tratos de Araranguá demonstra que ainda existem lacunas na interpretação e aplicação da legislação protetiva, especialmente quando interesses econômicos se confrontam com direitos dos animais.